Direito e Justiça: antônimos ou sinônimos? Um estudo de caso envolvendo o direito à saúde e o tratamento de diabetes
Acolhido em recurso o pedido de liminar que fiz para que Érica iniciasse o quanto antes o tratamento (1), o Tribunal de Justiça de São Paulo fixou 10 dias para o cumprimento da ordem judicial. Mas, mesmo eu avisando pessoalmente a Secretaria da Saúde sobre sua obrigação, levando até o Secretário da Saúde cópia da decisão, Érica não recebeu a bomba de infusão de insulina, nem os insumos, nesse prazo. Mais um mês estava se passando.
Informado acerca do descumprimento por parte da Secretaria Estadual de Saúde, o Juiz concedeu novo prazo, agora de 5 dias, para que a insulina e a bomba e os respectivos insumos fossem definitivamente entregues. E mais uma vez, levei pessoalmente a cópia da decisão judicial até o Secretário do Estado da Saúde.
Faltando apenas um dia para o fim do segundo prazo (e já passados dois meses da concessão da liminar), Érica recebeu um telegrama da Secretaria do Estado da Saúde informando que os medicamentos referentes ao seu processo estavam disponíveis para retirada no posto de distribuição.
Mas, ao comparecer no local indicado para retirada dos insumos, não recebeu nada, porque a bomba de insulina não era a indicada na receita médica - apresentada ao Secretário de Saúde por 3 vezes - fato reconhecido pela própria Secretaria do Estado da Saúde, que orientou Érica a “esperar mais um pouco” para que comprassem o aparelho correto.
Érica também recebeu a informação de que a Secretaria do Estado da Saúde havia “aprovado” apenas o fornecimento da bomba de insulina, ou seja, não receberia os demais insumos necessários à sua utilização (cateter e reservatório), nem a insulina
Como ao final da decisão o Juiz do Tribunal de Justiça mencionou a concessão do “equipamento médico pleiteado”, em clara utilização de metonímia (2), já que o pedido era de fornecimento da bomba infusora de insulina e dos demais equipamentos necessários à sua utilização, sem os quais não tem utilidade para x usuárix, limitando-se ao sentido literal do termo, o Estado de São Paulo dispôs a Érica apenas a bomba infusora. Forneceu a bomba infusora de insulina, recusando-se a fornecer a insulina.
Somente após a ameaça de bloqueio da conta bancária do Estado de São Paulo, e depois de uma discussão hermenêutica prescindível sobre o sentido da expressão “equipamento médico pleiteado” - partindo-se do pressuposto de que gestores da saúde, Juízes e Procuradores do Estado entendem figuras de linguagem e raciocínio lógico - a paciente recebeu do SUS a bomba de insulina e seus insumos, e também a insulina.
A partir de então, receberia todo mês os insumos da bomba na quantidade utilizada mensalmente, como ocorre com os portadores de doenças crônicas que utilizam medicamentos por período indeterminado e/ou vitalício fornecidos pelo SUS.
Mas, em função do cinismo estatal e da falta de pulso e de sensibilidade do Juiz que conduzia o processo, que poderia e deveria ter aplicado multas e bloqueado a conta do Estado antes - sem prejuízo de processar o Secretário da Saúde por improbidade administrativa (3), conforme eu havia pedido desde o primeiro descumprimento de prazo, Érica começou seu tratamento apenas 3 meses depois de concedida a liminar pelo Tribunal de Justiça.
Reflexão pessoal:
Lamentável perceber que a Secretaria do Estado da Saúde de São Paulo, além de não cumprir o objetivo para que foi constituída – cuidar da saúde dos cidadãos, ainda tenta ludibriar a pessoa doente e necessitada de tratamento, e o Judiciário também, seja por não cumprir as ordens judiciais no prazo, seja por tentar entregar “gato por lebre”, no caso uma bomba de infusão de insulina diferente da indicada pelo médico. E pior, entregar a bomba de insulina, e não entregar a insulina e os demais insumos para uso do equipamento.
Referências:
(1) Leia o capítulo anterior em http://deboraligieri.blogspot.com.br/2014/07/portadores-de-doencas-cronicas-nao-sao.html
(2) Figura de linguagem que consiste em empregar um termo no lugar de outro, havendo entre ambos estreita afinidade ou relação de sentido, como, no presente caso, a parte (equipamento) pelo todo (terapêutica com a bomba infusora de insulina e respectivos materiais de utilização).
(3) O Código de Processo Civil brasileiro em vigor até o fim de 2015, em seu artigo 461 e parágrafos, autoriza o Juiz a determinar todas as medidas próprias ao cumprimento da ordem judicial. Neste caso, considerando que o Estado de São Paulo não forneceu os materiais para a utilização da bomba infusora de insulina, bloqueou-se valor em dinheiro correspondente à quantia necessária para a aquisição pelo próprio autor da ação.
Acolhido em recurso o pedido de liminar que fiz para que Érica iniciasse o quanto antes o tratamento (1), o Tribunal de Justiça de São Paulo fixou 10 dias para o cumprimento da ordem judicial. Mas, mesmo eu avisando pessoalmente a Secretaria da Saúde sobre sua obrigação, levando até o Secretário da Saúde cópia da decisão, Érica não recebeu a bomba de infusão de insulina, nem os insumos, nesse prazo. Mais um mês estava se passando.
Informado acerca do descumprimento por parte da Secretaria Estadual de Saúde, o Juiz concedeu novo prazo, agora de 5 dias, para que a insulina e a bomba e os respectivos insumos fossem definitivamente entregues. E mais uma vez, levei pessoalmente a cópia da decisão judicial até o Secretário do Estado da Saúde.
Faltando apenas um dia para o fim do segundo prazo (e já passados dois meses da concessão da liminar), Érica recebeu um telegrama da Secretaria do Estado da Saúde informando que os medicamentos referentes ao seu processo estavam disponíveis para retirada no posto de distribuição.
Mas, ao comparecer no local indicado para retirada dos insumos, não recebeu nada, porque a bomba de insulina não era a indicada na receita médica - apresentada ao Secretário de Saúde por 3 vezes - fato reconhecido pela própria Secretaria do Estado da Saúde, que orientou Érica a “esperar mais um pouco” para que comprassem o aparelho correto.
Érica também recebeu a informação de que a Secretaria do Estado da Saúde havia “aprovado” apenas o fornecimento da bomba de insulina, ou seja, não receberia os demais insumos necessários à sua utilização (cateter e reservatório), nem a insulina
Como ao final da decisão o Juiz do Tribunal de Justiça mencionou a concessão do “equipamento médico pleiteado”, em clara utilização de metonímia (2), já que o pedido era de fornecimento da bomba infusora de insulina e dos demais equipamentos necessários à sua utilização, sem os quais não tem utilidade para x usuárix, limitando-se ao sentido literal do termo, o Estado de São Paulo dispôs a Érica apenas a bomba infusora. Forneceu a bomba infusora de insulina, recusando-se a fornecer a insulina.
Somente após a ameaça de bloqueio da conta bancária do Estado de São Paulo, e depois de uma discussão hermenêutica prescindível sobre o sentido da expressão “equipamento médico pleiteado” - partindo-se do pressuposto de que gestores da saúde, Juízes e Procuradores do Estado entendem figuras de linguagem e raciocínio lógico - a paciente recebeu do SUS a bomba de insulina e seus insumos, e também a insulina.
A partir de então, receberia todo mês os insumos da bomba na quantidade utilizada mensalmente, como ocorre com os portadores de doenças crônicas que utilizam medicamentos por período indeterminado e/ou vitalício fornecidos pelo SUS.
Mas, em função do cinismo estatal e da falta de pulso e de sensibilidade do Juiz que conduzia o processo, que poderia e deveria ter aplicado multas e bloqueado a conta do Estado antes - sem prejuízo de processar o Secretário da Saúde por improbidade administrativa (3), conforme eu havia pedido desde o primeiro descumprimento de prazo, Érica começou seu tratamento apenas 3 meses depois de concedida a liminar pelo Tribunal de Justiça.
Reflexão pessoal:
Lamentável perceber que a Secretaria do Estado da Saúde de São Paulo, além de não cumprir o objetivo para que foi constituída – cuidar da saúde dos cidadãos, ainda tenta ludibriar a pessoa doente e necessitada de tratamento, e o Judiciário também, seja por não cumprir as ordens judiciais no prazo, seja por tentar entregar “gato por lebre”, no caso uma bomba de infusão de insulina diferente da indicada pelo médico. E pior, entregar a bomba de insulina, e não entregar a insulina e os demais insumos para uso do equipamento.
Referências:
(1) Leia o capítulo anterior em http://deboraligieri.blogspot.com.br/2014/07/portadores-de-doencas-cronicas-nao-sao.html
(2) Figura de linguagem que consiste em empregar um termo no lugar de outro, havendo entre ambos estreita afinidade ou relação de sentido, como, no presente caso, a parte (equipamento) pelo todo (terapêutica com a bomba infusora de insulina e respectivos materiais de utilização).
(3) O Código de Processo Civil brasileiro em vigor até o fim de 2015, em seu artigo 461 e parágrafos, autoriza o Juiz a determinar todas as medidas próprias ao cumprimento da ordem judicial. Neste caso, considerando que o Estado de São Paulo não forneceu os materiais para a utilização da bomba infusora de insulina, bloqueou-se valor em dinheiro correspondente à quantia necessária para a aquisição pelo próprio autor da ação.
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