terça-feira, 28 de março de 2017

Reflexões biopolíticas - O conhecimento e o exercício de poder sobre os corpos (ou Como produzir novas verdades a partir das nossas experiências de vida?)

Car@s Amig@s da blogosfera. 

Compartilho aqui com vocês algumas reflexões a partir da leitura do primeiro texto do livro “Em defesa da sociedade” (aula de 07 de janeiro de 1976 de Michel Foucault no Collège de France), e também as anotações feitas durante o debate com os demais colegas da disciplina de "Biopolítica e micropolítica na produção de modelos tecnoassistenciais", da pós-graduação da Faculdade de Saúde Pública da USP, sob coordenação da Profª. Laura Camargo Macruz Feuerwerker.

Na verdade, este é um convite para a continuação e ampliação do diálogo na rede, através de novos comentários e reflexões que venham se somar a esses que publico agora. 

E começo questionando: onde estão as frestas da produção crítica do conhecimento sobre saúde? Como garantir espaços de disputa de sentidos sobre saúde sem tender à "pacificação" das ideias e à regularização dos modos de vida? 

foto das anotações do debate da aula inaugural, 
imagem que será retomada ao final da disciplina


Foucault – Em defesa da Sociedade – Aula de 07.01.76

No primeiro texto/aula do livro “Em defesa da sociedade”, que reúne o conteúdo desenvolvido por Michel Foucault no Collège de France entre os meses de janeiro a março de 1976 na disciplina de “Histórias dos sistemas de pensamento”, nos deparamos já no início com uma espécie de aviso do autor: estamos aqui para pensar. Mas Foucault deixa escapar uma observação sobre a existência de uma associação entre o que é ensinado e o que se paga para ser ensinado. Seria essa uma tentativa de, mais do que ressaltar a indissociabilidade da educação do sistema político-econômico em que se insere, chamar a atenção para uma certa instrumentalidade ou intencionalidade do campo do desenvolvimento dos saberes, para tentar superar ou ampliar o pensamento para além desses limites?

Foucault parte de uma análise das modificações no modelo de suas aulas como providência necessária à realização de trocas entre professor e alunos e alunas, tendo por foco o desenvolvimento de pesquisas mais objetivas, identificando as ferramentas de produção do saber científico, entre elas a produção de narrativas como instituidoras desse saber. E também como essa produção de saberes está muito mais associada a verdades como convenções do que propriamente a questionamentos filosófico-científicos.

Em seguida Foucalut identifica as frestas de produção crítica do conhecimento dessas narrativas filosóficas a partir de algumas características: localidade/particularidade (em contraposição à aplicação geral) dos questionamentos; percepção de saberes sujeitados a eleição de versões e fontes oficiais da história com a abertura de espaço para os “saberes das pessoas”, que chamou de saber histórico das lutas. É no acoplamento entre as correntes eruditas não oficiais da filosofia e os saberes das pessoas que se localiza a genealogia do saber histórico das lutas.

A disputa então não seria em torno da verdade, mas do poder de dizer a verdade (quem e a partir de quais conhecimentos), em que teorias científicas universais se revelariam como uma espécie de autoritarismo científico, objetivando o poder como vantagem essencial ao estabelecimento de relações entre forças desiguais, relações de submissão.

Foucault passa então a analisar a pertinência do questionamento sobre a natureza do poder, propondo a correspondência das concepções liberal-jurídica e  marxista de poder a uma ideia economicista da teoria do poder. No direito o poder seria identificado como qualidade inerente à propriedade, uma operação jurídica de troca contratual, e no marxismo o poder equivaleria ao domínio dos meios de produção e da força de trabalho como forma de fazer prevalecer o domínio de classe. No primeiro se encontraria o modelo formal do poder político, e no segundo sua razão de ser histórica e o princípio de sua forma concreta e de seu funcionamento.

Embora reconheça essa funcionalidade econômica do poder, Foucault busca outra abordagem para além do que chama de economismo, questionando o poder a partir de como ele é exercido sobre a vida das pessoas, nos corpos. Foucault localiza na repressão e na disputa de forças (guerra) a essência do poder para além do economismo. O poder assim considerado seria uma forma de repressão (hipótese de Reich), de acomodação das disputas sociais (hipótese de Nietzsche).


Debate em aula:

A ciência não é neutra e é atravessada por outros interesses, essa é uma discussão atual.

Quais são mesmo as relações entre poder e economia? Foucault questiona a lógica de subordinação das relações de poder aos objetivos econômicos.

Há uma intencionalidade na prevalência de uma ideia sobre outra? Ou permanecem aquelas que emplacam? A volta a determinados filósofos não ocorre através de um comando central, mas através da dinâmica de forças da sociedade que vão operando ao longo do tempo. Quando fala dos saberes sujeitados, Foucault não aplica o termo intencionalidade, mas fala em “objetivo”.

As décadas de 60 e 70 representaram um movimento de questionamento de tudo, de vários aspectos e de vários modos. Mesmo que rechaçados num primeiro momento, os conhecimentos produzidos podem depois ser recapturados. Foucault questiona justamente como o poder opera nessa produção de conhecimento, como essa máquina de guerra vai questionar e produzir outras ordens. Tem uma certa construção de valores afirmativos sobre soberania, legitimidade, o contrato social….como é que monta esse negócio?

O poder tem a incumbência (legitimidade?) para defender a sociedade?

É necessário localizar o texto em seu contexto político de produção. Nos anos 60 e 70 o mundo estava dividido pela guerra fria, é sob essa perspectiva que os questionamentos são feitos.

O texto é um exercício interessante de problematização. Quando fazemos uma pesquisa, praticamente já sabemos a resposta. Foucault vai em busca de novos problemas pensando se os saberes a serem produzidos serão capturados ou não, como operarão. Foucault pretende produzir novas visibilidades.

O conhecimento é uma arma para destruir verdades, uma forma de resistência, e que está intimamente relacionado ao poder. “A política é a guerra continuada por outros meios”.

Poder não é só repressão, mas produção. São diferentes linhas de força operando nessa produção ativa, há invenções também, o poder produz possibilidades e por isso se sustenta. Há efeitos, apropriações e produções, não há uma ideologia que cega as pessoas.

Existe um certo regime de verdade, onde estão inseridos profissionais de saúde e usuários.

A vida em produção fabrica corpos, enquanto a medicina estuda regularidades. Pensar em como a vida está se produzindo para se manter, conforme as ideias de Foucault nesse texto, talvez seja mais importante do que estudar e buscar as regularidades.

O poder do discurso também atua de maneira muito forte, mas não é apenas o saber científico que orienta as práticas. A explicação geral que reduz tudo é insuficiente para abrir o combate.

Um jeito interessante de interrogar é pensar a partir dos efeitos. A construção de políticas públicas de saúde com a participação da comunidade é uma diretriz do SUS criada a partir da experiência das lutas da reforma sanitária. Na prática, há muitas dificuldades nessa participação social. Mas, ao invés de responsabilizar gestores ou usuários por não colocar em prática de forma adequada o instituto, seria mais interessante questionarmos os pressupostos do controle social pensando em seus efeitos. O que isso produz? Faz sentido pensar numa participação apenas nos grandes espaços mas que não participa da produção quotidiana da vida?

Os espaços institucionais acomodam a “oficialidade”, mas não abrigam as disputas existentes. Como escapar do institucional?

Os usuários são convidados a participar de reuniões dos profissionais e dos gestores, mas não são considerados como pessoas com uma vida que se desenvolve em outros espaços que não sejam os serviços de saúde, produzindo outras possibilidades. Considerar a vida que acontece para fora dos serviços de saúde é pensar outras formas de produção de saúde e de vida.

Saúde se produz como valor. Questionar a saúde não é deixar de se importar com a vida das pessoas, é pensar em outras possibilidades de produção de saúde.

Esse texto é um convite ao desconforto, ao questionamento constante, à percepção das modificações em constante emergência.

Foucault não acredita em relações que não envolvam a disputa de forças e o poder, o poder atravessa todas as relações sociais.

Como produzimos novas verdades a partir das nossas experiências de vida?

quinta-feira, 9 de março de 2017

Precisamos dos insumos e medicamentos de diabetes, precisamos do apoio dos Conselhos de Saúde!

A Lei nº 8.142/90, uma das Leis Orgânicas da Saúde, regulamentou a forma representativa de participação da comunidade (uma das diretrizes constitucionais do SUS) no âmbito da saúde no Brasil, criando os Conselhos de Saúde, órgãos representativos do controle social.

Os Conselhos de Saúde são compostos por representantes do governo, prestadores de serviço, profissionais de saúde e usuários do SUS, e atuam na formulação de estratégias e no controle da execução das políticas de saúde em cada esfera de governo. Portanto, Conselho Nacional de Saúde (CNS) formula e controla a execução da Política Nacional de Saúde; os Conselhos Estaduais de Saúde formulam e controlam a execução da política regional de saúde em cada Estado; e os Conselhos Municipais de Saúde formulam e controlam a execução da política regional de saúde em cada Município.

Como órgãos promotores do diálogo entre a administração pública da saúde (Ministério da Saúde e Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde) e a sociedade (todos nós cidadãos), podemos buscar os Conselhos de Saúde para comunicar e pedir o apoio para a solução de problemas, necessidades e demandas, e também para nos representar na cobrança de providências das gestões executivas para a garantia do direito de acesso universal, integral e equânime à saúde, em que se insere a assistência farmacêutica do SUS.

(Saiba mais sobre os Conselhos de Saúde lendo a cartilha do CNS "Conselhos de saúde: a responsabilidade do controle social democrático do SUS", acessível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/conselhos_saude_responsabilidade_controle_2edicao.pdf)




Desde o início deste ano de 2017, pessoas com diabetes de São Paulo vem enfrentando a falta crônica dos materiais integrantes do Programa de Automonitoramento Glicêmico (AMG ou kit diabetes). Em quase todas as Unidades Básicas de Saúde do Município faltam fitas medidoras, lancetas, seringas (estas já desde meados de 2016), lixo para pérfuro-cortantes e os próprios glicosímetros. Em muitas unidades também faltam insulina e metformina, além de medicamentos para tratamento de doenças associadas ao diabetes tipo 2, como hipertensão.

A situação é a mesma em nível estadual. Na Unidade Dispensadora Tenente Pena (UDTP), da Secretaria do Estado da Saúde, responsável pelo fornecimento de medicamentos e insumos excepcionais em função de ordens administrativas e judiciais, os usuários não recebem qualquer dos materiais de bomba de infusão de insulina desde fevereiro.


Imagem publicada no facebook por Aureloyse Maximo para denunciar a falta de insumos na UDTP para tratamento de seu filho com diabetes tipo 1


Assim, é importante que nós usuários comuniquemos o desabastecimento nas UBS's ao Conselho Municipal de Saúde de São Paulo e busquemos o apoio dos Conselheiros para cobrar providências do Secretário Municipal de Saúde, Wilson Pollara, para restabelecimento do fornecimento do kit diabetes e demais medicamentos e insumos imprescindíveis ao nosso controle glicêmico.

Da mesma forma, devemos comunicar o desabastecimento da UDTP, e de demais Departamentos Regionais de Saúde (DSR's) da Secretaria Estadual de Saúde no interior do Estado, ao Conselho Estadual de Saúde de São Paulo, e pedir o apoio dos Conselheiros na cobrança de providências do Secretário do Estado da Saúde, David Uip, para restabelecimento do fornecimento dos medicamentos e insumos imprescindíveis à nossa sobrevivência digna.

Para quem não sabe exatamente o que escrever aos Conselheiros, sugerimos as seguintes mensagens:


Ao Conselho Municipal de Saúde de SP - email: cmssp@prefeitura.sp.gov.br

Assunto: Desabastecimento de medicamentos e insumos de diabetes - solicitação de ajuda do CMS

Mensagem:

Prezadas amigas e prezados amigos do Conselho Municipal de Saúde de São Paulo.

Há ___ anos sou portador(a) de diabetes tipo ___ e há ____ anos estou cadastrada no Programa de Automonitoramento Glicêmico (AMG) do Município de São Paulo, através do qual recebo (descrever os insumos recebidos entre fitas, lancetas, insulinas NPH e Regular, seringas, e lixo para materiais pérfuro-cortantes), e ainda retiro os medicamentos (descrever nome dos medicamentos) na farmácia da UBS do bairro de _______. Todavia, desde o mês de _____ (incluir mês e ano), não recebo (citar insumos e medicamentos faltantes), o que vem prejudicando o meu controle glicêmico e a continuidade do meu tratamento de saúde, além de insegurança quanto às consequências e riscos desse descontrole, com efeitos no desenvolvimento do meu (trabalho, estudo ou ambos) e da minha vida pessoal. Conversando com outros usuários do SUS da cidade de São Paulo, e lendo notícias sobre o assunto, percebi que esta não é uma situação isolada na minha UBS, mas um problema alastrado por toda a cidade de São Paulo.

Por este motivo, gostaria de solicitar o apoio dos integrantes deste Conselho na solução do problema, incluindo o desabastecimento de medicamentos da assistência farmacêutica e de insumos do programa AMG para tratamento de diabetes na pauta da próxima reunião do pleno, e de demais comissões pertinentes, para que se discutam medidas para exigir do Secretário Municipal de Saúde de São Paulo explicações sobre os motivos desse desabastecimento tão prolongado, e ainda cobrar uma solução imediata para o restabelecimento do fornecimento dos insumos e medicamentos imprescindíveis à saúde e à vida das pessoas com diabetes.

Desde já, agradeço o apoio deste Conselho na defesa do direito à saúde das pessoas com diabetes, e também em defesa do SUS!



Ao Conselho Estadual de Saúde de SP - email: ces@saude.sp.gov.br

Assunto: Desabastecimento de medicamentos e insumos de diabetes - solicitação de ajuda do CES

Mensagem:

Prezadas amigas e prezados amigos do Conselho Estadual de Saúde de São Paulo.

Há ___ anos sou portador(a) de diabetes tipo ___ e há ____ anos recebo (descrever os insumos e medicamentos recebidos) na(o) (Unidade Dispensadora Tenente Pena ou Departamento Regional de Saúde de ___) da Secretaria do Estado da Saúde de São Paulo, por decisão em processo (judicial ou administrativo) de dispensação excepcional de insumos e medicamentos. Todavia, desde o mês de _____ (incluir mês e ano), não recebo (citar insumos e medicamentos faltantes), o que vem prejudicando o meu controle glicêmico e a continuidade do meu tratamento de saúde, além de insegurança quanto às consequências e riscos desse descontrole, com efeitos no desenvolvimento do meu (trabalho, estudo ou ambos) e da minha vida pessoal. Conversando com outros usuários que retiram seus insumos e medicamentos para tratamento de diabetes na mesma unidade, e lendo notícias sobre o assunto, percebi que esta é uma situação generalizada, que vem afetando muitos outros portadores de diabetes.

Por este motivo, gostaria de solicitar o apoio dos integrantes deste Conselho na solução do problema, incluindo o desabastecimento crônico e constante de medicamentos e de insumos para tratamento de diabetes na (UDTP ou DRS) na pauta da próxima reunião do pleno, e de demais comissões pertinentes, para que se discutam medidas para exigir do Secretário do Estado de Saúde de São Paulo explicações sobre os motivos desse desabastecimento tão prolongado, e ainda cobrar uma solução imediata para o restabelecimento do fornecimento dos insumos e medicamentos imprescindíveis à saúde e à vida das pessoas com diabetes.

Desde já, agradeço o apoio deste Conselho na defesa do direito à saúde das pessoas com diabetes, e também em defesa do SUS!


Imagem: Carlos A. Rotea Jr.


Se todos nós que estamos sem nossos insumos e medicamentos nos mobilizarmos e enviarmos mensagens aos Conselhos de Saúde, mostraremos que a situação é grave e atinge muitas pessoas. E através da representação dos Conselheiros, teremos nosso direito à saúde defendido com a cobrança de providências das gestões municipal e estadual de saúde de São Paulo para regularização da assistência farmacêutica do SUS a todas as pessoas com diabetes, no Município e no Estado. 

E ainda estaremos participando da gestão democrática da saúde, através do exercício do controle social, e contribuindo para o funcionamento do sistema público de saúde.

terça-feira, 7 de março de 2017

Em 8 de março as mulheres irão às ruas para exigir direitos iguais


Por Mônica Nunes, no Conexão Planeta

Quando o momento exige, não há melhor forma para se fazer ouvir do que sair às ruas em grupo e protestar. E é isso que milhares de mulheres pelo mundo farão no Dia Internacional da Mulher, que – apesar de ter sido deturpada ao longo da história pelo comércio –, é uma data muito propícia para esta manifestação. A ideia é, inclusive, dar um novo tom a esse dia, resgatando sua intenção original.

Para isso, é imprescindível envolver não só as mulheres, mas homens, adolescentes, famílias, transgêneros e todos que reconheçam a legitimidade da mobilização e também queiram lutar por direitos.

Mas claro que muita gente não vai poder participar, ainda mais num momento de desemprego e de grande pressão nas grandes corporações. Por isso, o movimento indica OUTRAS MANEIRAS DE SE MANIFESTAR E ADERIR À CAUSA: parar uma hora no trabalho e otimizá-lo com conversas sobre as desigualdades, usar um detalhe ou uma peça de roupa lilás – cor símbolo da iniciativa – e boicotar as tarefas domésticas.

Quem puxou essa grande manifestação mundial – que está sendo chamada informalmente de greve internacional feminina já que envolverá mais de 30 países – foram dois dos maiores movimentos feministas do mundo: Ni Una Menos, que começou na Argentina e se espalhou pela América Latina, e a Marcha das Mulheres pelo Mundo.

A ideia é transformar 8 de março em um marco para novas relações com as mulheres nas sociedades, protestando contra as desigualdades de gênero, o machismo, o feminicídio, a exploração no trabalho e adesumanização feminina. Como? Convocando todas as mulheres a abandonarem seus postos de trabalhos (seja onde for!) e sair às ruas.

Entre os países que já confirmaram sua adesão, por intermédio de grupos feministas, estão Austrália, Bolívia,Brasil, Chile, Costa Rica, República Checa, Equador, Inglaterra, França, Alemanha, Guatemala, Honduras, Islândia, Irlanda do Norte, Irlanda, Israel, Itália, México, Nicarágua, Peru, Polônia, Rússia, El Salvador, Escócia, Coreia do Sul, Suécia, Togo, Turquia, Uruguai e EUA.




No Brasil

Por aqui, a violência contra a mulher e a reforma da Previdência proposta pelo governo Temer são a principais bandeiras desta mobilização. No caso da aposentadoria, a reivindicação se refere a equiparação de idade entre homens e mulheres. Com um detalhe: em geral, as mulheres trabalham cerca de cinco horas semanais em tarefas domésticas todos os dias, além da jornada remunerada.

Em São Paulo, estão sendo organizados dois grandes encontros – na Avenida Paulista, em frente ao MASP, e na Praça da Sé -, mas há outras mobilizações menores programadas pela cidade. Tudo para facilitar a participação. A página 8M – Paralisação Internacional das Mulheres em São Paulo, no Facebook, está sempre atualizada. Tem também o convite para o evento que mantém links relacionados na coluna da direita com os demais eventos do dia.




Como essa história começou

Essa greve começou a ser planejada depois de dois protestos realizados em 2016: um em 3 de outubro (que ficou conhecido como segunda negra), na Polônia, contra a lei do aborto, e outro, no mesmo mês, no dia 19 (vulgo quarta feira negra) na Argentina, que uniu milhares de mulheres contra os assassinatos ocorridos naquele ano – foram cerca de 200!

Mas a inspiração para este tipo de protesto – que intervém diretamente na produção – veio, na verdade, da Islândia. Em 24 de outubro de 1975, 90% das islandesas abandonaram o trabalho e foram às ruas para lutar por igualdade de direitos. A manifestação ficou conhecida como Dia Livre das Mulheres e conseguiu dar visibilidade para dois fatos importantes: a diferença vergonhosa de salários entre homens e mulheres e o trabalho doméstico não remunerado.



Carta e nova imagem

Na semana passada, a americana Angela Davis e ativistas das universidades assinaram carta publicada no jornal The Guardian – Mulheres dos Estados Unidos: estamos em greve. Junte-se a nós para que Trump veja o nosso poder – na qual convidam as americanas para aderir à greve geral “contra a violência masculina e em defesa dos direitos reprodutivos”. Sua intenção é mobilizar não só mulheres, mas também transgêneros, para construir uma nova agenda: “antirracista, anti-imperialista, anti-neoliberal e anti-heteronormativa”.

Entre elas, há um enorme sentimento de ojeriza ao marketing do falso “empoderamento” e à imagem do feminismo corporativo, que apenas incentivaram políticas conservadoras e as regras do livre mercado para as mulheres, mesmo em políticas que pareciam voltadas para defender seus direitos.

E isso ficou ainda mais claro com o barulho feito pela Marcha das Mulheres em 21 de janeiro, encorajando-as a buscar uma nova fase para a luta pela igualdade de gênero. As americanas estão chamando essa nova onda de mobilizações planetárias de Feminismo do 99% , enfatizando os direitos sociais. Não há dúvida de que a mudança para um novo e mais justo futuro só poderá ser feita por mulheres corajosas – e homens e outros gêneros idem. Mulheres de todo mundo vão abandonar seus postos de trabalho no próximo dia 8 de março exatamente por isso.

No Brasil, bem que poderíamos aproveitar a data para fazer um protesto ainda mais amplo em todos os sentidos, dada à urgência de combater nossa realidade política: um protesto com mulheres, homens, jovens, crianças, aposentados, trabalhadores, desempregados… pelas mulheres, claro! Mas também pela volta da democracia, dos direitos humanos, da justiça, da humanidade. E por eleições diretas. Aqui, todos os direitos estão sendo perdidos.





CONVOCAÇÃO PARA A GREVE INTERNACIONAL DE MULHERES NO BRASIL - 8 DE MARÇO, publicada no site do 8M Brasil

Neste 08 de março, a terra treme. As mulheres do mundo nos unimos e organizamos uma medida de força e um grito comum: Greve Internacional de Mulheres. 

Nós paramos. Fazemos greve, nos organizamos e nos encontramos entre nós. Colocamos em prática o mundo no qual queremos viver. 



Paramos para denunciar: 

Que o capital explora nossas economias informais, precárias e intermitentes. 

Que os Estados nacionais e o mercado nos exploram quando nos endividam. 

Que os Estados criminalizam nossos movimentos migratórios. 

Que recebemos menos que os homens e que a diferença salarial chega, em média, a 26% na América Latina. 

Que não é reconhecido que as tarefas domésticas e de cuidado são trabalhos não remunerados e adicionam três horas a nossas jornadas laborais. 

Que estas violências econômicas aumentam nossa vulnerabilidade diante da violência machista, cujo extremo mais brutal são os feminicídios. 

Paramos para reivindicar o direito ao aborto livre e para que não se obrigue nenhuma menina a enfrentar a maternidade. 

Paramos para visibilizar o fato de que, enquanto tarefas de cuidado não sejam uma responsabilidade de toda a sociedade, nos vemos obrigadas a reproduzir a exploração classista e colonial entre mulheres. Para ir ao trabalho, dependemos de outras mulheres. Para migrar, dependemos de outras mulheres. 

Paramos para valorizar o trabalho invisível que fazemos, que constrói redes de apoio e estratégias vitais em contextos difíceis e de crise. 


Paramos porque estão ausentes as vítimas de feminicídio, vozes apagadas violentamente ao ritmo assustador de treze (13) por dia só no Brasil. 

Estão ausentes lésbicas e travestis assassinadas por crimes de ódio. 

Estão ausentes as presas políticas, as perseguidas e as assassinadas em nosso território latino-americano para defender a terra e seus recursos. 

Estão ausentes as mulheres presas devido a delitos menores que criminalizam as formas de sobrevivência, enquanto os crimes corporativos e o tráfico de drogas permanecem impunes porque beneficiam o capital. 

Estão ausentes as mortas e as presas por abortos inseguros. 

Diante de lares que se tornam um verdadeiro inferno, nós nos organizamos para nos defendermos e cuidarmos umas das outras. 

Diante do crime machista e da pedagogia da crueldade, diante da tentativa dos meios de comunicação de nos vitimizar e de nos aterrorizar, fazemos do luto individual um consolo coletivo e da raiva, uma luta compartilhada. Contra a crueldade, mais feminismo. 
​ 


Nós usamos a estratégia da greve porque nossas demandas são urgentes. Fazemos da greve de mulheres uma medida ampla e atualizada, capaz de abrigar empregadas e desempregadas, a assalariadas e as que cobram subsídios, a autônomas e estudantes, porque todas somos trabalhadoras. Nós paramos. 

Nós nos organizamos contra o confinamento doméstico, contra a maternidade compulsória e contra a competição entre as mulheres, práticas impulsionadas pelo mercado e pelo modelo de família patriarcal. 

Nós nos organizamos em todas as parte: nas casas, nas ruas, no trabalho, nas escolas, nas feiras, nos bairros. A força do nosso movimento está nos laços que criamos entre nós. 

Nós nos organizamos para mudar tudo isso. 


Nós tecemos um novo internacionalismo. A partir das situações concretas em que estamos, nós interpretamos a conjuntura. 

Vemos que, diante do avanço neo-conservador na região e no mundo, o movimento das mulheres emerge como potência de alternativa. 

Que a nova "caça às bruxas", que agora persegue o que nomeia como "ideologia de gênero", tenta justamente combater e neutralizar nossa força e quebrar nossa vontade. 

Diante das múltiplas desapropriações, das expropriações e das guerras contemporâneas que têm a terra e os corpos das mulheres como territórios favoritos de conquista, nós nos incorporamos política e espiritualmente. 

​ 

Porque #VivasELivresNosQueremos, nos arriscamos em alianças incomuns. 

Porque nos apropriamos do tempo e construímos juntas a disponibilidade. Fazemos da nossa reunião um alívio e uma conversa entre aliadas; das assembleias, manifestações; das manifestações, uma festa; e da festa, um futuro em comum. 

Porque #EstamosJuntas, este 8 de março é o primeiro dia de nossa nova vida. 

Porque #ODesejoNosMove, 2017 é o momento da nossa revolução. 







quarta-feira, 1 de março de 2017

Debate “SUS em desmonte?” discute momento atual da saúde pública

O Sistema Único de Saúde (SUS) é um dos principais alvos das reformas propostas pelo presidente não eleito Michel Temer. As duas principais frentes de mudanças são a criação e difusão do Plano de Saúde Acessível e a redução de investimentos no SUS que, segundo especialistas, pode prejudicar o sistema pelas próximas duas décadas.

Discutir esse cenário atual é o principal objetivo do debate realizado pelo portal Saúde Popular e pela Rede Nacional de Médicas e Médicos Populares, no próximo dia 2 de março, às 19 horas, ao vivo pelo Facebook (https://www.facebook.com/saudepopular.org/).

Farão parte da discussão o economista e consultor da comissão de financiamento e orçamento do Conselho Nacional de Saúde (Cofin-CNS), Francisco Funcia, e a professora Laura Feuerwerker, da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo.

A PEC 55, que congela por 20 anos as despesas com Saúde, Educação e Previdência Social, também será tema do debate. Funcia considera essa proposta “o maior ataque ao SUS e à Constituição Federal dos últimos 30 anos”.

Laura trará suas contribuições como pesquisadora e médica. Sobre o SUS, ela acredita que há problemas reais no sistema que em grande medida vem sendo construído com menos recursos do que necessita. “Em países que têm modelo semelhante ao programa Saúde da Família, por exemplo, há uma média de uma equipe para cada 1.500 pessoas; aqui é um para cada 1.500, 2 mil famílias (três a quatro vezes mais gente)”. diz Laura.
Três reais por dia por pessoa é o valor que sustenta os serviços oferecidos pelo SUS somando recursos da União, estados e municípios. Esse valor seria suficiente? Como ficaria caso as reformas sugeridas se tornem realidades? São essas e outras questões que os entrevistados irão responder.

Participe e envie dúvidas na página do evento.






Francisco Funcia
Economista, consultor da Comissão de Financiamento e Orçamento do Conselho Nacional de Saúde (CNS). Diretor da ABrES – Associação Brasileira de Economia da Saúde. Possui graduação em Ciências Econômicas pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (1981) e mestrado em Economia Política pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (1998). Atualmente é consultor da Vignoli e Funcia Consultores Ltda. e da FGV Projetos e professor do Instituto Mauá de Tecnologia e da Universidade Municipal de São Caetano do Sul. Foi gestor dos cursos de Ciências Econômicas e Ciências Contábeis e Diretor da Área de Ciências Contábeis e Ciências Econômicas da Universidade Municipal de São Caetano do Sul. Tem experiência como gestor público e como diretor e gestor de curso superior. Tem experiência na área de Economia, com ênfase em Economia e Administração Pública, atuando principalmente nos seguintes temas: fiscal, finanças públicas, emprego, desenvolvimento, financiamento do Sistema Único de Saúde/SUS, conjuntura e política econômica.


Laura Feuerwerker
Possui graduação em Medicina pela Universidade de São Paulo (1983), mestrado em Saúde Pública pela Universidade de São Paulo (1997), doutorado em Saúde Pública pela Universidade de São Paulo (2002) e livre-docência em Saúde Pública pela Universidade de São Paulo (2012). Atualmente é professora associada da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo do Departamento de Prática de Saúde Pública, Linha de Pesquisa Política e Gestão. É colaboradora da Linha de Micropolítica do Trabalho e o Cuidado em Saúde da Pós-Graduação de Clínica Médica da Universidade Federal do Rio de Janeiro. No campo da produção do conhecimento, atua principalmente nos seguintes temas: políticas públicas na área da gestão, da produção do cuidado e do trabalho em saúde, educação de profissionais de saúde. Na extensão, desenvolve atividades de apoio à educação permanente e ao desenvolvimento da gestão junto a secretarias municipais de saúde e ao ministério da saúde.

Leia artigo de Laura Feuerwerker "Desmonte do SUS: desafios locais e a autonomia da gestão": https://saude-popular.org/2017/02/artigodesmonte-do-sus-desafios-locais-e-a-autonomia-da-gestao/