Na última segunda-feira participei de uma matéria do Jornal da Cultura a respeito de um alerta do Tribunal de Contas da União sobre a provável falta de insulinas análogas de ação rápida para diabetes tipo 1 a partir de maio, e ainda sem previsão de data para restabelecimento do fornecimento.
Um cabo de guerra entre governo e indústria farmacêutica, com muitas informações desencontradas a respeito dos reais motivos dessa falta, que podem envolver questões relacionadas ao oligopólio da produção de comercialização da insulina no mundo, falta de soberania na produção e desenvolvimento de tecnologias em saúde, falta de planejamento e redução do orçamento para a saúde dos governos pós golpe de 2016, trapalhadas burocráticas na aquisição do medicamento, fragmentação entre o processo de Avaliação de Tecnologias em Saúde (ATS) e a política de assistência farmacêutica para garantir o acesso da população na ponta aos medicamentos e insumos, e até mesmo uma espécie de pressão das empresas estrangeiras para fragilização do Governo Lula.
Na matéria, a companheira Denise Franco fala sobre os riscos a que estão sujeitas crianças e adolescentes, boa parte dos portadores de DM1, sem o acesso às insulinas análogas. Eu ressalto a incorporação das insulinas análogas como uma conquista da comunidade diabética que, por meio da articulação entre o ciberativismo em diabetes, associações de pacientes e sociedades profissionais, conseguiu levantar a necessidade de acesso aos análogos de insulina como uma pauta importante para o cuidado das pessoas com diabetes no Brasil, e comprovar por meio de suas experiências práticas com a tecnologia a relevância da substituição da insulina Regular (cujo inconcebível retorno ao uso em função do aumento das hipoglicemias graves é sugerido pelo Ministério da Saúde) pela insulina análoga de ação rápida.
Esse é um exemplo muito prático (e triste) do que constatei na minha pesquisa de mestrado analisando os posts de 60 páginas de diabéticos e seus familiares sobre a fragmentação do sistema de saúde. Transcrevo aqui as palavras do que afirmei na minha dissertação: "a campanha para disponibilização dos análogos tem um relevo muito maior no corpus da pesquisa do que as mobilizações pela incorporação, revelando problemas na etapa pós-incorporação de medicamentos e mostrando a ATS como um processo que, apesar de sua sofisticação técnica, não garante o acesso à tecnologia incorporada" (https://bit.ly/3Kp370R - fls. 182/183).
Precisamos encontrar soluções para que esta fragmentação deixe de representar portadores de doenças crônicas sem os medicamentos necessários à sua sobrevivência, diabéticos sem a insulina necessária à sua sobrevivência. Precisamos de uma resposta imediata do Ministério da Saúde e das empresas que comercializam insulinas análogas, e esta reposta não pode ser o retorno ao uso de uma tecnologia que já se mostrou ineficaz ao controle do diabetes (como sugere o MS), nem a incapacidade de atendimento à demanda (escusa das farmacêuticas Novo Nordisk, Sanofi e Lilly).
As 3 empresas se esforçaram muito ao longo das últimas décadas para dominar 95% do mercado mundial de insulinas, agora tem um compromisso com os diabéticos de todo o mundo de promover o acesso ao medicamento cuja primeira patente a Lilly recebeu há 100 anos por apenas um dólar, porque Banting (um dos descobridores do efeito da insulina no controle do diabetes) acreditava ser um impositivo moral garantir o acesso de uma tecnologia que salva vidas a todas as pessoas do mundo com diabetes. Quem tem o bônus, deve arcar também com o ônus.
Queremos nossas insulinas análogas, é nosso direito! #analogosjá
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